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quinta-feira, 16 de junho de 2011

A EMENDA 66/10 E A QUESTÃO DA GUARDA DOS FILHOS

Vamos falar agora de uma questão que entendemos ser uma bastante importante no Direito de Família,  que é a guarda dos filhos.

Este é um tema relevante, que fez com que muitos juristas e professores, que escrevem sobre o tema, aguardassem a aprovação da emenda por conta do impacto da mesma no sistema.

Já mencionamos que a Emenda 66/10 trabalha com duas vertentes principais: ela acaba com a separação judicial no Brasil e também exclui qualquer prazo para o divórcio.

A ratio da emenda não foi a mantença da separação e sim sua extirpação do sistema. Nas palavras do Profº. Pablo Stolze, manter o entendimento de que a separação não foi extirpada do sistema é o mesmo que tirar com uma mão o avanço que a emenda dá com a outra.

E mais uma vez podemos dizer que só consegue entender melhor a importância da emenda do divórcio quem passou pelo problema do divórcio e que sofreu a desestruturação de seu casamento, ou aqueles que militam na área de família, advogados, promotores, conciliadores e juízes, que sentem o tormento daqueles que querem seguir um novo caminho de vida e sentem-se amarrados por um casamento falido.

Logo, a melhor interpretação da emenda está na linha do entendimento dos constitucionalistas de que houve uma inconstitucionalidade superveniente dos artigos que tratam da separação judicial no Código Civil ou ainda, como dito, ocorreu uma revogação tácita dos mesmos, como nós já explicamos nos itens anteriores.

Avançando no tema, precisamos tratar dos efeitos jurídicos da Emenda no sistema jurídico brasileiro e como já mencionado, uma das questões mais relevantes e que geram dúvidas é se a emenda do divórcio altera alguma coisa no que tange a guarda dos filhos. A guarda dos filhos sofreu algum tipo de impacto por conta da nova emenda?

Diretamente, não se pode dizer que houve um impacto, pois o objetivo da emenda foi facilitar o divórcio no Brasil, extirpando a separação judicial e banindo o elemento culpa, bem como acabando com os prazos para o divórcio no Brasil.

Logo, a Emenda do divorcio não tem como objetivo precípuo tratar da guarda de filhos. Porém, no momento em que há a facilitação do divórcio, fazendo com que de maneira mais rápida o casal consiga resolver os problemas para poder tocar suas vidas, isso gera um efeito benéfico sob o aspecto psicológico dos filhos, porque de nada adianta tentar justificar a mantença de um casamento com base na existência de filhos.

Por mais que os filhos sejam importantes em nossas vidas, eles crescem e tem suas vidas e por isso, de nada adianta manter um casamento falido com base na existência de filhos. Se não houver amor, o filho não ajudará na mantença do casamento que está com o afeto falido.

Muito pelo contrário: a falta de amor dentro do casamento acaba interferindo até mesmo no futuro do casamento desse filho. Isso é reflexo das experiências que o filho poderá ter durante sua vida, o que nos remete a um tópico importante que é o delicado problema da síndrome da alienação parental, lei recentemente aprovada no Brasil e que merece nossa atenção.

Assim, com a facilitação do divórcio para casais cujo casamento já se encontra totalmente falido, logicamente que esta facilitação deve gerar um efeito benéfico nos filhos, desde que eles tenham o devido acompanhamento, em especial, psicológico, e principalmente o afeto de seus pais.

Porque de nada adianta os pais acharem que só porque os filhos são muito pequenos que não estão entendendo o que está acontecendo. Quanto mais o casal forçar uma relação só por causa dos filhos mais eles ficarão inimigos e afundados numa verdadeira lama espiritual que nasce entre ambos, alem de fazer com que essas mágoas e tristezas passem para a pessoa dos filhos.

Nessa linha de raciocínio nós novamente pontuamos a premissa: a Emenda 66 de 2010 não mexe diretamente na guarda de filhos, muito embora esse tema mereça nossa atenção por conta do tema da síndrome da alienação parental.

No Brasil, a forma de guarda comumente utilizada é a chamada guarda unilateral ou exclusiva, a qual bem conhecemos. Este tipo de guarda vem do início do século XX, do Código anterior. Inclusive, na lei 6.515/77, a guarda unilateral foi usada como modelo padrão de família brasileiro.

Apenas para relembrar, guarda exclusiva ou unilateral é aquela em que o filho menor permanece somente sob a guarda de um dos pais que é o guardião deste filho, cabendo ao outro o direito de visitas, com maior contato geralmente com a metade das férias escolares.

É uma situação difícil porque, a despeito do pai não ter perdido o poder familiar, ele só poderá exercer o direito de companhia e visitas a partir do horário fixado na sentença.

Acredito que esse deva ser um dos temas que mais nos assolam quando estamos diante de um processo de divórcio ou de regulamentação de guarda e visitas, porque mesmo sabendo que nossa lei evoluiu (anteriormente a fixação da guarda era baseada no efeito culpa e essa a tradição no direito na égide da lei 6515 – o culpado perderá a guarda do seu filho), a questão da guarda ainda é tratada dessa forma unilateral.

Mas o elemento culpa cai do nosso sistema, na medida em que não é a culpa que vai fixar a guarda dos pais em relação ao filho.

Devemos parar e analisar cada caso de forma isolada, sem aplicar regras gerais. Como podemos afirmar que o cônjuge infiel não possa ser um ótimo pai ou ótima mãe, apesar do fim do casamento? Somente por imputar a ele o fato de uma traição o transforma em um “mau” pai?

Então, a partir do texto constitucional e do ECA, que reconhecem a prioridade e a proteção integral a criança e ao adolescente, não é a culpa que vai determinar a guarda unilateral ou exclusiva, devendo o juiz analisar conforme o Código Civil qual dos pais tem melhor condições para o exercício efetivo da guarda.

E condição para os olhos da lei não tem a ver com sexo (a mulher não tem uma primazia na guarda dos filhos no direito brasileiro) até porque sabemos que há pais que são mães e há mães que são pais. A condição se refere a melhor aptidão psicológica, moral para o exercício da guarda, e em geral, juiz nos casos de guarda unilateral, fixa a guarda apenas em favor de um dos pais, cabendo ao outro o direito de visitas geralmente aos finais de semana alternados e metade das férias escolares.

Mas nosso Código Civil foi alterado há pouco tempo, para consagrar no Brasil outro tipo de guarda muito comum nos EUA e na Europa, que é a famosa guarda conjunta ou compartilhada, modelo este que apresenta sem duvidas, uma gama de efeitos benéficos, justamente porque ela não cria uma situação de unilateralidade.

Na guarda compartilhada não existe apenas um guardião, mas sim, uma ação conjunta no exercício da guarda, onde pai e mãe exercem as funções de guardião, não havendo exclusividade.

Esse modelo de guarda compartilhada traz um menor impacto na formação psicológica da criança, na medida em que, se ambos os pais exercem o poder de guarda, na medida em que ambos se responsabilizam pela criança, não existindo a primazia de um deles, evitando aquele arcaico pensamento de um deles no sentido de superioridade ou propriedade em relação ao filho.

Esse tipo de guarda compartilha dá a idéia de que não cabe ao Estado impor um estilo de vida as partes e seus filhos. Ela tenta resgatar o mínimo de respeito que ainda existe no casamento, permanecendo a união do casal ao menos em relação aos filhos que juntos tiveram.

A guarda compartilhada permite que haja uma bilateralidade no exercício da guarda.

É por essa razão que existe a recomendação em nosso Diploma Civil para que o juiz que, nas audiências de divórcio, incentive aos pais para que adotem o modelo da guarda conjunta.

Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).

§ 1o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).

E como fica a questão dos alimentos quando da fixação deste modelo de guarda compartilhada? É necessária a fixação de alimentos?

Entendemos que a questão dos alimentos nesse caso se esvazia, apesar de ser possível sua menção na sentença por segurança jurídica, podendo cada pai arcar com 50% de um valor definido como gastos com os filhos. Mas na prática, se existe a responsabilização de ambos com a criação do menor, a dificuldade com o pagamento da pensão não deve ser óbice para a solução consensual do conflito.

Cabe ainda ressaltar que, no caso da guarda compartilhada, nada impede que a criança passe mais tempo na casa da mãe, podendo o pai também ter o filho em sua companhia em tempo superior a um único final de semana. É a liberdade na divisão de responsabilidades.

Mas não podemos confundir a guarda compartilhada, onde existe essa bilateralidade no exercício da guarda, sem exclusividade de algum dos pais, com a chamada guarda alternada.

Na guarda alternada existem períodos de exclusividade de um dos pais, onde nesse período há unilateralidade de guarda. Por exemplo, o juiz fixa que a guarda será da mãe de janeiro até abril, o pai ficará de maio até agosto, seguindo-se de novo período de guarda da mãe e assim sucessivamente, cabendo sempre ao outro, no período em que ele não detém a guarda o direito de visitas. Isso não é guarda compartilhada, porque nesta não há períodos de exclusividade.

No acordo de divorcio, de acordo com a nova Emenda, é preciso que se fixe um ponto: caso seja adotada a guarda compartilhada, tome muito cuidado com o Código Civil e a questão de o juiz “obrigar” a parte a guarda compartilhada.

O Código diz que o juiz poderá determinar a guarda compartilhada caso não haja acordo, mas, isso, somente se for possível. Isso significa que quando não há acordo em relação à guarda, é porque a situação está muito difícil de ser resolvida e revela que o casal tem um relacionamento péssimo, mal se fala em audiência, e nesse caso, onde não há qualquer proximidade entre essas pessoas, como é que o juiz em sã consciência vai obrigá-los a implantar a guarda compartilhada?

A guarda compartilhada exige ao menos o mínimo respeito e diálogo entre os pais para que conjuntamente decidam o destino da criança. Se numa situação de desamor, de desrespeito e dificuldade de trato se impõe a guarda compartilhada, isso é um convite até mesmo a violência física.

Por isso, somente em situações excepcionais é que o juiz pode obrigar o casal a implantar a guarda compartilhada.

Cada processo deve ser analisado com cuidado e cautela em busca dos menores riscos para a criança, seja na esfera física ou psicológica. Não pode haver risco para o crescimento da criança para imposição da guarda compartilhada. Mas, infelizmente, sabemos que tudo isso é de difícil aplicação na prática, o que não impede a reflexão sobre o tema.

No próximo post, vamos tecer alguns comentários sobre a lei da síndrome de alienação parental. Até lá!...

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